quarta-feira, 23 de junho de 2010

CERÂMICA DE MIRACI GANHA O MUNDO!



Sobre uma cerâmica de barro queimado e coberto por uma camada de tinta azul, Dona Miraci Felipe faz desenhos abstratos e precisos com a ponta de um pincel fino. Verdadeiras mandalas vão surgindo improvisadamente pelas mãos da artesã, que hoje está entre as dez melhores do Brasil. O reconhecimento veio durante o V Salão do Turismo Roteiros do Brasil e Vitrine Brasil, ocorridos na última semana de maio, no Parque Anhembi em São Paulo. Os produtos de Dona Miraci revelam a tradição ceramista do município de São Gonçalo do Amarante e hoje decoram casas e estabelecimentos comerciais em países como a Alemanha, México, China e Turquia.



Sentada em uma cadeira antiga de madeira, salpicada por tinta, Dona Miraci pedia desculpas pela simplicidade da casa. A artesã fez de seu talento, a sua profissão e conta que a venda de seus produtos lhe garantem uma vida digna, embora esteja longe do ideal. Ela produz cerca de 500 peças por mês. O trabalho é realizado sem ajuda de outras pessoas. Parte de seus produtos fica em exposição em centros de artesanato, como o de São Gonçalo do Amarante e parte é entregue sob encomenda.



Muitas das encomendas recebidas pela artesã chegam depois que participa de eventos como o Salão do Turismo e Roteiros do Brasil. “A feira é indispensável para a divulgação do meu trabalho”. Ela explica que os investimentos públicos para o desenvolvimento social, como o incentivo à criação de cooperativas, centros de artesanato e feiras de exposição, são essenciais e indispensáveis não só à divulgação do trabalho, mas à sua continuidade. Muitos dos artistas populares abrem mão de seus talentos porque não recebem incentivos e vão em busca de empregos nos centros urbanos. Ela também lamenta quando vê seus colegas se sentirem desestimulados.



Miraci leva tão a sério a divulgação do artesanato de São Gonçalo, que deixou de lado a encomenda de um grande número de peças, para participar do Salão de Turismo. No evento, expos seus produtos numa lojinha, e participou de outra duas situações. Compartilhou a sua técnica com demais artesãos e em outro demonstrou para o público as etapas da confecção de suas peças.



O seu desempenho nas oficinas e a qualidade de seu trabalho fizeram com que o público do evento elegesse a artesã como uma das dez melhores do Brasil. Os outros trabalhos classificados tinham como base o capim dourado, a madeira, a palha do milho dentre outros materiais. “Não vi nenhum trabalho semelhante ao meu”.


Para conferir o trabalho da artista, basta ir à São Gonçalo do Amarante, na comunidade Santo Antônio, onde mora, ou entrar em contato pelo telefone 3278-2363.


Criações


Quando Miraci era criança, a sua mãe, Francisca Felipe Antunes modelava os objetos de barro. Hoje a artesã compra as peças de outro morador de São Gonçalo, que vende para praticamente todos os artesãos da cidade.


As peças de barro são lixadas, para tirar as impurezas da queimação nos fornos. Em seguida ela passa uma demão de tinta à base de água na cor azul. A cor escolhida, segundo a artesão, é uma forma de dar continuidade a tradição local. Depois de secas, a artesã vai fazendo traços finos com a tinta branca. Os traços são criados na hora. “Se eu errar os traços tenho a possibilidade de consertar, mas raramente eu erro”. Daqueles traços surgem estampas complexas, que ganham um contorno azul claro. O acabamento é dado com pontinhos brancos em toda a peça.


Um vaso de aproximadamente 60 centímetros de altura pode ser vendido ao consumidor final por R$ 200,00. Já um anjinho de 10 centímetros é vendido por R$ 15,00. Apesar de preferir pintar cerâmicas azuis, a artesã também faz vasos coloridos, mas sempre com estampas de sua região.


Heranças


Apesar da obstinação por valorizar a cultura local, Miraci não tem nenhum herdeiro. Diferente de sua mãe que lhe transmitiu o gosto pelo trabalho com o barro, ela não conseguiu passar essa paixão à filha. “Os jovens de hoje não querem se sujar com barro e tinta”, disse a artesã sem ressentimento. Primeiro porque a filha está no sétimo período do curso de Direito – educação bancada com o seu trabalho –, depois porque a prefeitura de São Gonçalo está montando um espaço onde ela fará oficinas para a comunidade. “Quero deixar minha arte para as próximas gerações”. Aos 52 anos, ela já pensa em parar de pintar. Não pelo cansaço, mas por apresentar problemas de saúde, já que a tinta é um produto tóxico. Dona Miraci vem nos últimos anos, apresentando problemas respiratórios.

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